
A complexidade de um personagem deve ser moderada pela estrutura, enredo e trama e os núcleos da história. Ou seja, se pensa um personagem não de forma solta e aleatória, mas o quanto ele soma ao desenvolvimento do enredo e de seu universo.
Nesse artigo vamos ver alguns personagens, tanto complexos como descomplicados. Vamos buscar entender por que escritores, roteiristas optam por um tipo de personagem em grau de complexidade de sua personalidade e psique e outros buscam algo diferente.
Como o personagem surge?
Não há nenhuma restrição para como deve surgir um personagem e de que modo. Personagens com suas devidas complexidades podem vir por uma inspiração, esses momentos em que você vê uma situação alguém, e tcharam! Algo quase orgânico e esse tipo de fenômeno criativo eu respeito muito, e ele acontece em muitas mentes criativas, e podem reinar nela por anos, tornando cada vez mais complexo e vivo e palpável. É um processo maravilhoso de uma criatura crescer e se desenvolver até se tornar um ser crível! Um exemplo de personagens que ficam na cabeça de seus escritores antes de éter uma a estrutura ou um enredo qualquer escrito, ou seja pens num esboço mal delineado do que será história apenas para o complexo personagem se formar. Um caso desses se deu com talvez a história mais bem-sucedida de todos os tempos.
J.R.R. Tolkien e os Personagens de O Senhor dos Anéis
Detalhes: Tolkien passou décadas desenvolvendo os personagens e o mundo de O Senhor dos Anéis. Ele começou a idealizar os hobbits, elfos e outras raças fantásticas ainda nos anos 1910, antes mesmo de conceber a trama central da Terra-Média. Bilbo, Frodo, Gandalf e até figuras secundárias como Gollum foram amadurecendo em sua mente à medida que ele detalhava a mitologia, os idiomas e a geografia do mundo ficcional. Gollum, por exemplo, é um personagem profundamente complexo que representa tanto a corrupção quanto o sofrimento causado pelo poder do Anel, e sua evolução reflete o perfeccionismo de Tolkien no trabalho.
Impacto no Desenvolvimento: O fato de Tolkien deixar os personagens "fermentarem" por tanto tempo permitiu que eles fossem apresentados ao público com personalidades e dilemas extremamente refinados. Cada um deles é moldado por um senso de história e propósito, conectando-se à vasta mitologia que o autor criou.
J.K. Rowling e Harry Potter
Detalhes: Antes de escrever Harry Potter e a Pedra Filosofal, Rowling teve a ideia de um menino órfão que descobre ser um bruxo enquanto estava em um trem em 1990. No entanto, ela passou cerca de sete anos desenvolvendo não apenas Harry, mas também personagens como Hermione, Ron, Dumbledore e Snape. Rowling mencionou que Snape, por exemplo, foi um dos personagens que ela mais planejou antes mesmo de iniciar a escrita do primeiro livro, garantindo que sua complexidade fosse revelada gradualmente ao longo da série.
Impacto no Desenvolvimento: O tempo gasto pensando nos personagens permitiu que Rowling escrevesse histórias coesas com personalidades profundamente entrelaçadas no enredo. Harry, por exemplo, não é apenas um herói; ele é um menino lidando com perdas, traumas e a pressão de expectativas externas, o que reflete a dedicação da autora em pensar além de clichês simples.
Marcel Proust e Em Busca do Tempo Perdido
Detalhes: Proust é um exemplo clássico de um autor que deixou seus personagens se formarem ao longo de anos de introspecção. Ele baseou muitos personagens em si mesmo e em figuras de sua vida social. A narrativa de Em Busca do Tempo Perdido é tão intricada porque cada personagem foi pensado profundamente, com suas nuances, idiossincrasias e relacionamentos complexos. Proust usou sua memória e observação para explorar cada detalhe da vida interior de seus personagens, muitas vezes antes de estruturar qualquer trama definitiva.
Impacto no Desenvolvimento: O tempo que Proust passou "vivendo" com seus personagens em sua mente deu a eles uma autenticidade que os torna inesquecíveis. Ele é capaz de capturar nuances emocionais e psicológicas que tornam seus personagens universais e, ao mesmo tempo, intimamente únicos.
Victor Hugo e Jean Valjean (de Os Miseráveis)
Detalhes: Hugo idealizou Jean Valjean como um arquétipo de redenção e bondade humana, mas passou anos refinando sua personalidade antes de começar a escrever Os Miseráveis. Ele observava pessoas marginalizadas em Paris e usava suas experiências para construir o histórico emocional e moral de Valjean. Essa observação constante e reflexiva permitiu que o personagem fosse moldado como alguém profundamente marcado pelo sofrimento, mas também capaz de grandeza moral.
Impacto no Desenvolvimento: Jean Valjean não é apenas um ex-condenado, mas uma representação da luta por dignidade e humanidade em uma sociedade opressiva. O tempo gasto por Hugo pensando nele tornou sua história uma das mais poderosas na literatura.
Mary Shelley e Victor Frankenstein (de Frankenstein)
Detalhes: Shelley começou a desenvolver Victor Frankenstein como uma figura perturbada pela obsessão científica após uma conversa com amigos sobre ciência e o poder da criação. No entanto, ela passou meses refletindo sobre a psicologia de Victor antes de escrever sua história. Shelley imaginou os dilemas éticos e emocionais que ele enfrentaria, bem como suas motivações e a culpa que o consumiria.
Impacto no Desenvolvimento: Victor Frankenstein tornou-se um personagem rico em complexidade, simbolizando tanto o potencial quanto os perigos do progresso humano. A reflexão de Shelley antes de começar a escrever garantiu que sua narrativa fosse não apenas uma história de terror, mas também uma meditação filosófica.
Por que esses personagens foram tão bem desenvolvidos?
Esses exemplos mostram que deixar os personagens "viverem" na mente do escritor por meses ou anos os permite amadurecer e ganhar camadas de profundidade. Esse processo proporciona:
Autenticidade: Eles parecem mais reais, com motivações e falhas humanas.
Complexidade: Os personagens se tornam multifacetados, capazes de surpreender e engajar os leitores.
Conexão emocional: Eles refletem as experiências e reflexões do autor, criando uma ponte emocional com o público.
Versatilidade narrativa: A profundidade do personagem pode enriquecer qualquer enredo em que ele seja inserido.
Vamos ver por outro lado personagens famosos mais descomplicados e mais simples.
E argumentar suas escolhas por parte dos escritores e seu efeito nas histórias.
Tom Sawyer (de As Aventuras de Tom Sawyer por Mark Twain)
Composição: Tom é um garoto travesso e cheio de imaginação, guiado por impulsos e um senso de aventura infantil. Sua moralidade é simples, reflexo de sua juventude.
Noção Literária: Twain o criou como uma representação do espírito despreocupado da infância. Sua simplicidade é proposital para destacar o contraste entre a inocência e as complexidades do mundo adulto.
Sancho Pança (de Dom Quixote por Miguel de Cervantes)
Composição: Sancho é um camponês prático e leal, movido principalmente por desejos terrenos, como comida e conforto. Ele é o contraponto cômico à grandiosidade de Dom Quixote.
Noção Literária: Cervantes usa Sancho como uma âncora realista para o idealismo de Quixote. Sua simplicidade serve para reforçar a dualidade entre realidade e imaginação.
Lennie Small (de Ratos e Homens por John Steinbeck)
Composição: Lennie é um personagem ingênuo e inocente, cuja força física contrasta com sua vulnerabilidade emocional e intelectual. Ele age puramente por instinto e emoção.
Noção Literária: Steinbeck criou Lennie para simbolizar a fragilidade da inocência em um mundo cruel. Sua simplicidade enfatiza a brutalidade das condições sociais e econômicas.
Huck Finn (de As Aventuras de Huckleberry Finn por Mark Twain)
Composição: Huck é um garoto livre de convenções sociais, que age de acordo com sua intuição e senso de justiça básico. Ele é sincero e direto.
Noção Literária: Twain usou Huck para criticar a hipocrisia da sociedade adulta e explorar os temas de liberdade e moralidade. Sua simplicidade torna suas ações mais autênticas.
Atticus Finch (de O Sol é para Todos por Harper Lee)
Composição: Embora moralmente íntegro e idealista, Atticus é apresentado de forma direta, como um símbolo de justiça e bondade. Sua personalidade não apresenta conflitos internos complexos.
Noção Literária: Harper Lee o criou como uma figura de moralidade inabalável em um mundo cheio de injustiça. Sua simplicidade reforça sua posição como um exemplo ético claro.
A proposta do personagem surge de diversas formas, não há regra e sim o discernimento do autor com sua história e seus objetivos. As finalidades temáticas, e o próprio estilo literário ditam a necessidade e o nível de complexidade adotado para cada personagem. Vamos pegar por exemplo Titanic roteiro escritor por James Cameron. O filme é um dos maiores sucessos de bilheteria de todos os tempos chegando a ficar por muito tempo como a maior bilheteria da história do cinema, com US$ 2.264 bilhões. O par romântico Jack e Rose, são simples, descomplicados. Essa decisão é sábia para o tipo de história que se está contando, a tragédia é o espetáculo, e nada pode ofuscar isso. Usar um par romântico é uma forma apenas de realçar a tragédia que está por vir e ter uma cara para nos identificarmos. Não há um nível de profundidade complexa em nenhum personagem de Titanic. Jack é pobre, sonhador e destemido. Rose rica, romântica e infeliz na bolha que vive. Você faz os dois se encontrarem e s e apaixonarem, nada mais. O noivo de Rose: Arrogante e controlador.
Veja que essas qualidades do caráter poderiam ser trabalhas com complexidade sem dúvida, contudo isso custaria uma atenção a um núcleo desnecessário e provavelmente atrapalharia no ritmo do filme. A escolha de Cameron é mais certa por ele saber que tipo de filme quer fazer e que sensação quer do público. É um filme comercial, para grande público, não é uma regra, mas filmes com alta bilheteria, na maior parte das vezes não cria camadas complexas em seus personagens. Mas é claro que existem filmes com personagens mais complexos que fizeram grandes bilheterias. Um exemplo disso é Coringa. Compare Coringa com Jack de Titanic, veja então a enorme diferença em complexidade dramática e composição dos personagens. Coringa faturou $1,074 bilhão mundialmente. Uma bilheteria extraordinária com um personagem complexo, o filme explora a degradação mental e emocional de Arthur, levando-o a se transformar no infame Coringa. Sua luta contra a sociedade e suas próprias perturbações cria um estudo de personagem profundo. No caso a escolhas dos roteiristas é totalmente voltada a Arthur Fleck / Coringa (Joaquin Phoenix); veja a escolha é totalmente certa, assim como em Titanic, contudo em Coringa é o oposto se em Titanic o que importa é o drama do naufrágio em primeiro lugar e não os personagens descomplicados em Coringa Arthur Fleck / Coringa (Joaquin Phoenix) é tudo no filme, o personagem em primeiro e ele é responsável por todas emoções que sentimos, depois vem Ghotam e todas outras coisas mas tudo em segundo plano, tudo está ali para Coringa caminhar com toda sua complexidade dramática.
Assine nossa Newsletter
para receber mais desse conteúdo

Comments